“Tarde Vos amei! Ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei! Eis que estáveis dentro de mim, e eu fora de mim Vos procurava; e, disforme como era, lançava-me sobre as belas coisas que criastes. Estáveis comigo, mas eu não estava convosco.” Santo Agostinho
Estas palavras de Santo Agostinho, proferidas ao descobrir Deus dentro de si, ecoam perfeitamente a fome e a sede de Deus que animam os Paulinos do século XXI. Com efeito, muitas vezes procuramos o sentido da vida religiosa e a relevância do apostolado paulino fora de nós mesmos. Contudo, falhamos em reconhecer que esses tesouros já são nossos — herdados do rico património do nosso Fundador, o Beato Tiago Alberione, e pulsando dentro do carisma paulino sempre vivo e dinâmico. A resposta está dentro de nós, mas permanecemos curiosamente cegos, olhando para fora em busca de uma luz que já arde intensamente nos nossos próprios corações.
No que diz respeito à evangelização através dos meios de comunicação social, mais do que no século XX, hoje esses meios e as tecnologias modernas estão muito mais desenvolvidos, poderosos e relevantes. Reconhecemos e valorizamos os seus progressos, mas, ainda assim, hesitamos e tropeçamos em entrar neles ou em utilizá-los e geri-los adequadamente. Poder-se-ia dizer com Santo Agostinho acerca do nosso apostolado: “Estáveis comigo, mas eu não estava convosco”.
No dia 20 de agosto de 2025, a Sociedade de São Paulo celebrou o seu 111.º aniversário de fundação, enquanto a Sociedade na Índia comemorou 90 anos de presença. A caminhada tem sido longa, mas ainda há muitos marcos a descobrir e a alcançar na missão. Este momento histórico para a Congregação — e também para a Igreja Católica, que celebra o Sínodo sobre a Sinodalidade e o Jubileu de 2025 — convida-nos à reflexão: a um modelo mais sinodal e a um discipulado renovado, como Peregrinos da Esperança. Neste tempo significativo, e à luz destes acontecimentos, as palavras de São João Paulo II interpelam todos os membros da Sociedade de São Paulo à introspeção sobre a vida e a missão:
“Não tenhais medo. Não vos contenteis com a mediocridade. Fazei-vos ao largo e lançai as redes para a pesca (cf. Lc 5,4). Ide às raízes! Sede exigentes convosco mesmos, talvez com os outros, mas, antes de tudo, convosco mesmos!”
Façamos, pois, uma viagem à nossa vida e missão, à luz deste “voltar às raízes” — uma peregrinação de caminhar juntos, sustentados por uma fé e esperança vivas, invocando a intervenção divina para uma experiência verdadeiramente divina!
Noite de Luz: a Renovação Eucarística
Imaginemos se a experiência eucarística do Beato Tiago Alberione, naquela Noite de Luz, também se tornasse nossa — tua e minha — moldando a nossa vida e missão no contexto atual da Igreja, da Congregação e do mundo contemporâneo. Alberione tinha uma clara consciência do seu nada, mas acreditava firmemente que da Eucaristia vinha a Luz, o Alimento, a Consolação, a Vitória sobre o mal e tudo o mais.
Sim, para nós é novamente uma jornada de regresso às origens, ao Tabernáculo, onde nascemos. Não é apenas uma visita ao Santíssimo Sacramento para cumprir uma obrigação, mas uma peregrinação de fé, esperança, transformação e missão no século XXI. Naquela noite, Alberione foi à adoração com plena disponibilidade e mente aberta, para ser iluminado, envolvido pela graça divina e totalmente dependente de Deus — e, como resultado, “a sua mente e o seu coração ficaram fixos na Eucaristia, no Evangelho, no Papa, no novo século, nos novos meios.”
Hoje, somos chamados a ancorar a nossa missão nesses mesmos pilares, abraçando as ferramentas modernas — como a Inteligência Artificial e as plataformas digitais, entre outras. Quando as nossas comunidades estão enraizadas nesta antiga devoção eucarística, tornam-se reflexos vivos da visão de Alberione — novas Casas de Alba, ressoando com propósito divino. Hoje, de certo modo, somos responsáveis por manter viva esta dádiva do Espírito Santo que chegou até nós através do nosso Fundador.
Continuidade da missão paulina
O Beato Tiago Alberione decidiu reunir homens e mulheres consagrados para uma nova forma de apostolado, conduzindo-os à perfeição evangélica, especialmente pelos conselhos evangélicos, e à recompensa da vida apostólica. Este carisma específico de Alberione tem sustentado a missão paulina ao longo das gerações, assegurando unidade, estabilidade e continuidade.
Hoje, os Paulinos têm a responsabilidade acrescida de manter viva a inspiração recebida do Espírito Santo: fomentar uma congregação de religiosos, promovendo vocações e formando jovens Paulinos com o mesmo zelo e espírito de São Paulo Apóstolo.
A especialização em comunicação, particularmente no setor editorial, deve ser incentivada entre os jovens Paulinos, como meio de fortalecer o apostolado. Igualmente, é essencial prestar especial atenção à formação permanente de todos os membros.
Um único espírito: viver Jesus Cristo e servir a Igreja
O espírito e a missão de cada Paulino, segundo o nosso Fundador, é “viver o Evangelho de Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida, plena e completamente, no espírito de São Paulo, sob o olhar de Maria, Rainha dos Apóstolos.
”Enraizados nas palavras do Fundador, os Paulinos são chamados a viver a sua consagração na e para a Igreja. Inclinam sempre a mente, o coração e a vontade para pensar, trabalhar e sentir com a Igreja e, portanto, escrever em conformidade com o seu ensinamento.”
Por isso, a nossa relação com a Igreja Universal e Local é indispensável e vital, deve ser uma relação de sintonia com o coração da Igreja, onde quer que estejamos.
Como afirmam as nossas Constituições.
“Um dos compromissos principais da Congregação no apostolado é a inserção na ação pastoral orgânica da Igreja, tanto a nível geral como local. A Congregação realiza isso cooperando com a Igreja na área da comunicação social e harmonizando os seus programas com os da Igreja.”
Este compromisso vai além da simples colaboração: é dar sentido à vida, encontrar realização na missão de Cristo Mestre, e garantir que a missão paulina permaneça sempre atual, relevante e fecunda.
Evita-se, assim, o desgaste da mediocridade. Somos chamados a encarnar a visão do Papa Francisco, que, na abertura do Sínodo em 9 de outubro de 2021, disse:
“Uma Igreja que não se afasta da vida, mas se mergulha nos problemas e necessidades de hoje, ligando feridas e curando corações feridos com o bálsamo de Deus. Não esqueçamos o estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura.”
Ser Apóstolos Hoje
O jovem Alberione foi iluminado pela conferência de Giuseppe Toniolo, que insistia em que fosse “apóstolo do seu tempo”[9]; desde então, e ao longo da vida, viveu como tal. Neste 111.º aniversário da Fundação, também nós não podemos ser apóstolos de ontem ou de amanhã, mas apóstolos de hoje, das realidades humanas atuais.
Neste contexto, as duas realidades eclesiais — o Sínodo 2021-2024 e o Jubileu 2025 — oferecem um verdadeiro roteiro missionário: sermos apóstolos para o mundo de hoje. Os temas e lemas destes eventos falam com força a todos os âmbitos da Igreja e das realidades humanas — cultura, economia, ecologia, humanidade.
Como apóstolos paulinos, podemos neles encontrar profunda inspiração, compreensão do mundo, discernimento e um renovado sentido da nossa vocação de viver e agir na Igreja por Cristo.
O Sínodo sublinhou que “a sinodalidade é o caminhar juntos dos cristãos com Cristo e para o Reino de Deus, em união com toda a humanidade. Orientada para a missão, a sinodalidade implica escuta mútua, diálogo e discernimento comunitário.”
Tornar-se sinodal, e tornar-se apóstolo paulino hoje, é um processo em três etapas:
- Escuta das realidades do mundo. da Igreja à política global, das questões humanitárias à crise ecológica, da Inteligência Artificial à investigação espacial. Não uma escuta passiva ou diplomática, mas uma escuta do Espírito Santo, em vista da conversão e renovação.
- Diálogo com essas realidades, desenhando programas pastorais e apostólicos nos níveis congregacional, provincial e regional.
- Discernimento comunitário, pois o apostolado paulino é sempre comunitário e sinodal. Cada ato de evangelização paulina deve ser fruto de um esforço comum, colegial e corresponsável.
Celebrando estas realidades históricas da Igreja e da Congregação, encontramos-nos num cruzamento de graça e desafio. As jornadas sinodal e de renovação devem ser vividas como Peregrinos da Esperança, à sombra da Palavra e da Eucaristia. Quando o caminho se torna árduo e o mar da vida agitado, a nossa esperança permanece no Senhor, que não desilude.
O essencial é permanecermos firmes, como São Paulo exorta:
“Portanto, meus irmãos muito amados, sede firmes e inabaláveis, progredindo sempre na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é em vão.” (1 Cor 15,58)
Assim, somos chamados a uma grande convergência: voltar o olhar para dentro, como fez Agostinho, para descobrir a Beleza que sempre habitou em nós; e, a partir dessa nascente de graça eucarística, voltar-nos para fora com coragem apostólica. Os marcos que celebramos não são apenas memórias do passado, mas lançadeiras para o futuro.
Chamam-nos a ser, sem ambiguidades, apóstolos de hoje — atentos aos clamores do mundo, dialogando com as suas complexidades e discernindo, em comunidade, como anunciar o Evangelho com os meios do nosso tempo. Saíamos, pois, da sombra da mediocridade e entremos na “Noite de Luz” que chama cada Paulino.
Abracemos o espírito do nosso Fundador, não como uma relíquia a venerar, mas como um fogo a reacender — um fogo que alimenta a nossa caminhada como Peregrinos da Esperança. Ancorados na Eucaristia, unidos à Igreja e armados com a sabedoria das raízes e a audácia do Espírito, façamo-nos ao largo. Pois a nossa missão não é procurar uma luz distante, mas revelar o esplendor da Luz que já arde em nós, chamando-nos a incendiar o mundo com a verdade de Cristo.
Por: Dominic Savio D’Silva, SSP
Texto original: www.paulus.net